Luís Borges: “A fotografia, para mim, é algo muito emocional”

A fotografia apareceu na vida de Luís Borges ainda durante a infância. Enquanto não teve a primeira máquina, era num caderno que registava tudo o que via, ao mesmo tempo que pastoreava animais. Hoje, concilia esta paixão com a vida de professor em Terras de Bouro, Gerês, e uma acaba por complementar a outra.
Na exposição “Ruralidades” procurou recuperar parte das suas memórias, mas em simultâneo perpetuá-las, como nos explicou.
O que o motivou para criar as fotografias que compõem a exposição “Ruralidades”?
Esta mostra – que é o resultado de cerca de dez anos de puro prazer – consiste de várias fotografias relacionadas com aldeias de montanha do Alto Minho, nomeadamente das serras: Amarela, Soajo, Peneda e o Planalto de Castro Laboreiro. Tendo a sensibilidade de ter crescido no mundo rural, e sabendo que muitos dos motivos fotografados brevemente farão parte da história, quis relembrar aos mais velhos e mostrar aos mais novos um mundo rural em vias de extinção.
Foi, então, por ter crescido nesse universo rural que escolheu este tema?
O meio rural, e tudo o que a ele está associado, é o meu meio natural, é lá que me sinto confortável a fotografar. Portanto, que outro tema podia escolher? É mais fácil apresentar temas com os quais tenho uma grande afinidade.
Diria que a ausência dessa afinidade é o seu maior desafio na fotografia?
Sim. A minha maior dificuldade é quando tenho de fotografar motivos com os quais não tenho grande afinidade. Nesses casos sinto-me um fotógrafo perfeitamente trivial. E a fotografia, para mim, é algo muito emocional.
Tendo em conta que o seu foco é, muitas vezes, o rosto humano, sente que isso leva à existência de um elo ou sentimento caraterísticos?
Sim. Quando ouço todas aquelas histórias de vida, por vezes consigo revê-las nos seus rostos retratados, nas suas rugas, nos seus cabelos, nas suas mãos calejadas do trabalho árduo, nos seus olhos… Além disto, sinto uma nostalgia que me remete para o tempo em que tinha avós e passava horas a ouvir as sua histórias.
Como, e quando, é que a fotografia apareceu na sua vida?
Desde cedo demonstrei alguma aptidão para a imagem, mas as origens humildes não me permitiam ter uma máquina fotográfica, por isso contentava-me, enquanto pastoreava os animais, com um pequeno bloco de desenho, rabiscando o que me despertava a atenção. Ao mesmo tempo pensava como seria mais simples se tivesse uma máquina fotográfica e, ainda que sem saber, já treinava o olhar e os meus enquadramentos. Só quando um tio me deixava pegar na sua Nikon, totalmente manual, podia realmente fotografar. Quando recebi o meu primeiro ordenado realizei este sonho e, desde então, nunca mais deixei de fotografar.
Como é o seu processo de trabalho?
É um processo maioritariamente solitário. Para mim, a fotografia é também uma terapia que me ajuda na azáfama diária da profissão de professor. Nos intervalos da atividade letiva subo às serras, vencendo escaladas e intempéries, à semelhança dos pastores. Mas ao descer, em vez de um animal morto, como se fosse um caçador afortunado, trago fotografias.
Ao longo de todos os anos que tem dedicado à fotografia, há algum momento que tenha ficado particularmente marcado na sua memória?
Cada imagem tem uma história associada. Conto apenas esta porque me marcou e me ajudou a crescer como fotógrafo. Um dia, deslumbrado com um manto de neve que tinha caído durante a noite, exclamei, em voz alta: “Que sorte têm estas pessoas em poderem ver e sentir, várias vezes durante o ano, este magnífico espetáculo da natureza!” Mediante o meu comentário, uma pessoa que ia a passar disse: “Sorte?! Havia de ter, como eu, animais de corte para alimentar, pois com a neve não podem pastar! Talvez assim não achasse a neve tão espetacular!” Limitei-me a pedir desculpa pelo meu “deslumbre irrefletido”, e passei a ter mais cuidado com a exteriorização dos meus sentimentos.
Já tem planos para depois desta exposição?
Os projetos que me dão mais satisfação são a ilustração fotográfica de livros, pois assim os meus olhares ficam registados durante muitos anos e posso revê-los quando quiser. Atualmente estou envolvido na ilustração de um livro sobre toponímia da Serra do Gerês, em colaboração com um dos maiores especialistas nesta área, o Fernando Cosme.